domingo, 31 de julho de 2011

Casa Arrumada

Carlos Drummond de Andrade
















Casa arrumada é assim:
Um lugar organizado, limpo, com espaço livre pra circulação e uma boa entrada de luz.
Mas casa, pra mim, tem que ser casa e não um centro cirúrgico, um cenário de novela.
Tem gente que gasta muito tempo limpando, esterilizando, ajeitando os móveis, afofando as almofadas...
Não, eu prefiro viver numa casa onde eu bato o olho e percebo logo:
Aqui tem vida...
Casa com vida, pra mim, é aquela em que os livros saem das prateleiras e os enfeites brincam de trocar de lugar.
Casa com vida tem fogão gasto pelo uso, pelo abuso das refeições fartas, que chamam todo mundo pra mesa da cozinha.
Sofá sem mancha?
Tapete sem fio puxado?
Mesa sem marca de copo?
Tá na cara que é casa sem festa.
E se o piso não tem arranhão, é porque ali ninguém dança.
Casa com vida, pra mim, tem banheiro com vapor perfumado no meio da tarde.
Tem gaveta de entulho, daquelas que a gente guarda barbante,passaporte e vela de aniversário, tudo junto...
Casa com vida é aquela em que a gente entra e se sente bem-vinda.A que está sempre pronta pros amigos, filhos...
Netos, pros vizinhos...
E nos quartos, se possível, tem lençóis revirados por gente que brinca ou namora a qualquer hora do dia.
Casa com vida é aquela que a gente arruma pra ficar com a cara da gente.
Arrume a sua casa todos os dias...
Mas arrume de um jeito que lhe sobre tempo pra viver nela...
e reconhecer nela o seu lugar.

(Texto enviado por Caio Martins)

sábado, 30 de julho de 2011

Mario Quintana

30.07.1906 - 05.05.1994
















DAS UTOPIAS

Se as coisas são inatingíveis... ora!
não é motivo para não querê-las...
Que tristes os caminhos, se não fora
a mágica presença das estrelas!


TROVA

Coração que bate-bate...
Antes deixes de bater!
Só num relógio é que as horas
vão passando sem sofrer.


EU ESCREVI UM POEMA TRISTE

Eu escrevi um poema triste
e belo, apenas da sua tristeza.
Não vem de ti essa tristeza
mas das mudanças do Tempo,
que ora nos traz esperanças
ora nos dá incerteza...
Nem importa, ao velho Tempo,
que sejas fiel ou infiel...
Eu fico, junto à correnteza,
olhando as horas tão breves...
E das cartas que me escreves
faço barcos de papel!

sexta-feira, 29 de julho de 2011

Rizolete Fernandes

INCLEMÊNCIA
Rizolete Fernandes













Img: Christian Coigny - Women Outside_09


Inda pensada
a dor
é ferroada

Quando sorrateira
se instala
gota em gota
vira enxurrada

Se de repente
aguda inteira
fica
sendo passageira

A dor
faz inclemente
quem a sente

quarta-feira, 27 de julho de 2011

Lêdo Ivo

TORNO A OUVIR O MARULHO DAS ÁGUAS NEGRAS
Lêdo Ivo


Somos as nossas imagens. Quem imagina um deserto, no dia irrestituível, se refugia em sua própria desolação. A planície se abre para quem deseja evadir-se ou perder-se no mundo como uma dessas formigas transviadas que a ambição desviou do carreiro. O marulho das águas negras de uma lágrima, que eu ouvia durante a minha infância em Maceió, e tornei a escutar em Veneza, impõe em mim a direção de um universo em que os elementos mais contrários reclamam adesão e conluio.

A presença de mundos apartados, de matérias situadas antes das partilhas, é como a respiração dos amantes após o amor: ainda enlaçados e aprofundados um no outro, e misturados em suas águas cúmplices, já se acham contudos afastados pela súbita supressão do êxtase. Na lama fétida da lagoa, escondem-se a água universal do oceano e a areia profanada pelos miasmas desagregadores. Na cronologia pulverizada em que sou, ao mesmo tempo, sumiço e aparição, o minuto que passa tem uma fervilhação de formigueiro aberto! e as imagens profundas mais uma vez disputam o reconhecimento solar de um dia ofuscante como o verão que ilumina os lagartos entre as pedras. O vento, passageiro como um deus, deixa intactos os ninhos.

As mangueiras que palpitavam sob as chuvas grossas das madrugadas antigas — quando o lençol do menino insone se levanta como a brisa nas veias dos galeões pejados de ouro dos piratas — voltam a arfar na alameda mentirosa que franja meus sonhos devastados pelo martelar monótono das ondas. As estrelas mudam, repentinamente de posição, como as luzes dos aviões na curva celeste que antecipa a proximidade do aerporto. E eis-me de novo diante do dia, que é uma sucessão infindável de janelas abertas; e eis-me de novo diante da noite recendente aos laranjais em flor.

Mas todavia desabrimos a mão da massa confusa de seres e lembranças, sonhos e desconsolações, trabalhos e cóleras. E de todo o cadastro pessoal resta apenas, lumalha na escuridão, a imagem de um menino diante do Oceano, e que escuta, nas vagas e ventos acumulados ao redor do estaleiro apodrecido, a longa melodia da memória para sempre vitoriosa — essa música abafada, essa euforia das águas golfejantes e reunidas na foz do tempo, essa respiração do mundo que, importunando os vivos com a sua reiteração, já não tem prestígio sobre aqueles que, defuntos, estão além da desolação e da morte.

Do livro: "Confissões de um poeta", Difel/MEC, 1979, SP/DF

Fonte: Blocos Online

terça-feira, 26 de julho de 2011

Graça Graúna

A CAMINHO DO HAITI TEM UMA PEDRA (*)














Graça Graúna


tem uma jangada de pedra
a caminho do Haiti
a esperança se avizinha
pois navegar é preciso
ou como diz o velho Mago
uma obrigação todos temos.
E agora, que fazer?
A caminho tem uma pedra
e uma jangada se recria
pois não há mais tempo a perder
________

(*) Fiz este poema, pensando em Carlos Drummond de Andrade, autor do poema “No meio do caminho” e empreguei o termo Mago para homenagear SaraMAGO e a sua solidariedade ao povo do Haiti.

Fonte: Blocos Online

segunda-feira, 25 de julho de 2011

No Dia do Escritor, Leila Míccolis em prosa

Uma de papagaio...
Leila Míccolis


Já notaram como todos têm uma piada ou um "causo" de papagaio para contar? Falar sobre papagaio e futebol é como apresentarmos prova cabal de nossa nacionalidade brasileira. Em geral o que papagaio mais fala é palavrão, porque é incrível a imensa capacidade do ser humano em ensinar ao bichinho aquilo que ele gosta de ouvir. Seja porém por isso ou por aquilo, pela plumagem verde e amarela ou pelo seu jeito desinibido e obedientemente desbocado, o certo é que esta irrequieta ave está sempre presente nos papos de bar ou na boca de quem procura o riso fácil e estereotipado. Tenho um conhecido paulista que toda vez que vem ao Rio traz um repertório novo de piadas deste tipo, e, entre elas, há sempre inúmeras sobre o animalzinho tagarela.

Não vou reproduzir nenhuma delas... até porque não sou fã de anedotas escabrosas ou que transmitem mais preconceitos do que risos (as que ridicularizam mulheres - louras ou morenas, por exemplo -, ou as que zombam de gays, de portugueses, de paraíbas, de negros, etc.). Vou contar, porém, uma historinha verídica que me impressionou muito e que aconteceu há alguns anos com um amigo meu, poeta e crítico literário do Rio Grande do Norte. Para preservar-lhe a privacidade, vamos chamá-lo, aqui, hipoteticamente, de Juliano. Ele morava em uma cidade perto de Natal com a avó, cuja característica principal era ser uma mulher extremamente hipocondríaca. Apesar de relativamente moça e saudável, todas as noites desfiava um rosário de sintomas, todos perigosos, irreversivelmente fatais, e culminava dizendo ao neto: — "Desta noite não passo".

Na casa, havia um papagaio, muito diferente de todos os outros: era mudo. Jamais falara nada. Por mais que Juliano tivesse tentado ensiná-lo, ele fechava-se em seu silêncio e dele nunca se ouviu um currupacopapaco sequer, mesmo entredentes (ops, entrebico). Aos poucos, meu amigo foi desistindo de ensinar-lhe alguma coisa e, com o correr dos anos, acabou por acostumar-se ao silêncio do "louro". No entanto, sempre cuidadoso com ele, o rapaz todo dia levava-o para o quintal pela manhã e o apanhava à tardinha, quando voltava do seu trabalho no jornal.

Um dia, porém, devido a um temporal, meu amigo ficou preso na redação do jornal, em Natal, sem ter como se comunicar com a avó (pois em casa eles não tinham telefone e o da vizinha estava com defeito). Por nunca ter cuidado do papagaio, a avó nem se lembrou dele, até porque o animal não reclamava de nada: não piava, não miava nem latia... Quando Juliano voltou para casa, encontrou o papagaio ensopado. Recolheu-o, enxugou-o, mas, de noite, o bichinho começou a tossir muito. A avó, "perita em doenças", diagnosticou que aquilo era uma gripinha de nada, em dois ou três dias ele estava bom novamente, não era como ela, que estava nas últimas (sempre).

Ao deitar-se, Juliano fez um carinho na cabecinha do papagaio, todo encolhido e murcho. O louro olhou para ele e, pela primeira vez, dirigiu-lhe a palavra, dizendo: — "Dessa noite não passo". Juliano ficou animado: pelo menos a chuva tinha limpado a garganta de seu amiguinho, ele agora era um papagaio normal, que repetia o que sempre ouvira ao seu redor. No entanto, sua alegria durou pouco. No dia seguinte, o papagaio tinha mesmo "passado", morrera. Comentário de meu amigo, diante da enorme diferença, no caso, entre as pessoas e os animais:

— "Vovó matraqueia o tempo todo falando em morte, e continua viva. O papagaio, com incrível senso de propriedade, na única vez que falou, mostrou que entendeu direitinho o significado do que ela vive dizendo, e morreu sem desperdiçar uma única palavra. Que bicho mais sábio!...".

Fonte: Além das Letras - blog de Leila no YuBliss

(Publicado com a autorização da autora)

domingo, 24 de julho de 2011

Solano Trindade

Negra bonita












Solano Trindade
24.07.1908 - 19.02.1974



Negra bonita de vestido azul e branco
Sentada num banco de segunda de trem
Negra bonita o que é que você tem?
Com a cara tão triste não sorri pra ninguém?

Negra bonita
É seu amor que não veio
Quem sabe se ainda vem
Quem sabe perdeu o trem
Negra bonita não fique triste não
Se seu amor não vier
Quem sabe se outro vem
Quando se perde um amor
Logo se encontra cem
Você uma negra bonita
Logo encontra outro bem.

Quem sabe se eu sirvo
Para ser o seu amor
Salvo se você não gosta
De gente da sua cor
Mas se gosta eu sou o tal
Que não perde pra ninguém
Sou o tipo ideal
Pra quem ficou sem o bem...

sexta-feira, 22 de julho de 2011

Caio Martins

DESCOMPASSO

Para Jeanne

















(img: linga-3 - christian coigny)


Por que temer, mulher, que eu me desfaça
nas guerras de teu mundo incoerente
que dilaceram teus véus de inocente
essência elementar, com tua graça?

Quisera fosse o mundo indiferente
a tal ardor sutil mas que ameaça
a ordem do universo enquanto traça
vitrais de cicatrizes indecentes.

Desatas tuas bandeiras e sidérea
orbitas aos desmandos do que eu faço
só por querer-te assim tão louca e séria.

E vai-se enfim a noite em descompasso
de dança calcinada e já cinérea
enquanto dormes, farta, em meu cansaço.


Fonte: Caio Martins - Poemas e Crônicas

quinta-feira, 21 de julho de 2011

Glauco Mattoso

2.279 - SONETO A LEILA MÍCCOLIS












Que tem de pequenina, tem de terna.
Concentra em si um pouquinho da maneira
de cada mulher brava brasileira:
Pagu, Tarsila, Anita. Ela é moderna.

Por décadas de luta, já governa
o mundo alternativo, farta feira
de arte, em vibrações de feiticeira:
Assim é Leila Míccolis, eterna.

Respeito a seus direitos ela cobra.
Ao bom comportamento é sempre avessa.
À fácil caretice não se dobra.

A frase lapidar dessa cabeça
é verso que resume grande obra:
"Falo do óbvio, antes que me esqueça."


Do livro: "Geléia de Rococó - Sonetos Barrocos", Edições Ciência do Acidente, SP, 1999

Fonte: Site de Leila Míccolis

terça-feira, 19 de julho de 2011

Vladimir Maiakovski

O Amor
Vladimir Maiakovski
(19.07.1893 – 14.04.1930)


Um dia, quem sabe,
ela, que também gostava de bichos,
apareça
numa alameda do zôo,
sorridente,
tal como agora está
no retrato sobre a mesa.
Ela é tão bela,
que, por certo, hão de ressuscitá-la.
Vosso Trigésimo Século
ultrapassará o exame
de mil nadas,
que dilaceravam o coração.
Então, de todo amor não terminado
seremos pagos
em inumeráveis noites de estrelas.
Ressuscita-me,
nem que seja só porque te esperava
como um poeta,
repelindo o absurdo quotidiano!
Ressuscita-me,
nem que seja só por isso!
Ressuscita-me!
Quero viver até o fim o que me cabe!
Para que o amor não seja mais escravo
de casamentos,
concupiscência,
salários.
Para que, maldizendo os leitos,
saltando dos coxins,
o amor se vá pelo universo inteiro.
Para que o dia,
que o sofrimento degrada,
não vos seja chorado, mendigado.
E que, ao primeiro apelo:
- Camaradas!
Atenta se volte a terra inteira.
Para viver
livre dos nichos das casas.
Para que doravante
a família seja
o pai,
pelo menos o Universo;
a mãe,
pelo menos a Terra.




domingo, 17 de julho de 2011

18 de julho: Dia Nelson Mandela


“A educação é a arma mais poderosa que você pode usar para mudar o mundo.”


“Sonho com o dia em que todos levantar-se-ão e compreenderão que foram feitos para viverem como irmãos.”



Nelson Mandela



Os sul-africanos estão prontos para comemorar nesta segunda-feira os 93 anos do ex-presidente Nelson Mandela, considerado um herói por muitos no país.
A fundação que leva o nome de Mandela pediu à população que faça 67 minutos de trabalho voluntário neste dia 18 de julho - para representar os 67 anos que o ex-presidente dedicou à luta política na África do Sul.
O ícone da luta contra o regime de segregação racial na África do Sul (Apartheid) deverá passar seu aniversário com familiares no vilarejo de sua infância, na província de Cabo Oriental.
Os 12 milhões de crianças matriculadas nas escolas do país também deverão cantar simultaneamente para Mandela, pela manhã.
Às 8h05 pelo horário local (3h05 em Brasília), os alunos de toda a África do Sul deverão cantar "Feliz Aniversário, Tata Madiba" - uma música composta especialmente para os 93 anos do ex-presidente.


Fonte: BBC Brasil

sexta-feira, 15 de julho de 2011

Se Tudo Pode Acontecer (Arnaldo Antunes)



Se Tudo Pode Acontecer
Arnaldo Antunes

Se tudo pode acontecer
Se pode acontecer qualquer coisa
Um deserto florescer
Uma nuvem cheia não chover

Pode alguém aparecer
E acontecer de ser você
Um cometa vir ao chão
Um relâmpago na escuridão

E a gente caminhando de mão dada de qualquer maneira
Eu quero que esse momento dure a vida inteira
E além da vida ainda de manhã no outro dia
Se for eu e você
Se assim acontecer. . .

quinta-feira, 14 de julho de 2011

“Legião, almas para todo gosto”

Exposição do artista plástico João Werner














Exposição individual com 25 gravuras digitais, retratos de pessoas imaginárias.
Visitação: de 18 de julho a 14 de outubro de 2011
Local: Galeria João Werner, rua Piauí, nº 191, sala 71, 86010-420, Londrina, PR.
Horário: das 14h às 20h, com monitoria.
Entrada gratuita, mas o artista aceita doações.

Acesse o link: http://www.joaowerner.com.br/exposicoes-de-joao-werner/exposicao_legiao_gravuras_digitais.htm 

Contato João Werner: (43) 3344-2207, werner.joao@gmail.com

terça-feira, 12 de julho de 2011

Tupac Amaru (1781)

Pablo Neruda
12.06.1904 - 23.09.1973


Captura de Tupac Amaru - Felipe Guamán Poma de Ayala
  






















Condorcanqui Tupac Amaru,
sábio senhor, pai justo,
viste subir a Tungasuca
a primavera desolada
dos patamares andinos
e, com ela, sal e desdita,
iniqüidades e tormentos.

Senhor Inca, pai cacique,
tudo em teus olhos se guardava
como num cofre calcinado
pelo amor e pela tristeza.
O índio te mostrou o ombro
no qual as novas mordidas
brilhavam nas cicatrizes
de outros castigos apagados,
e era um ombro e outro ombro,
todas as alturas sacudidas
pelas cascatas do soluço.

Era um soluço e outro soluço.
Até que armaste a jornada
dos povos cor de terra,
recolheste o pranto em tua taça
e endureceste as veredas.

Chegou o pai das montanhas,
a pólvora levantou caminhos,
e às aldeias humilhadas
chegou o pai da batalha.
Jogaram a manta na poeira,
uniram-se os velhos punhais,
e o búzio matinho
chamou os vínculos dispersos.
Contra a pedra sanguinária,
contra a inércia desgraçada,
contra o metal das correntes.
Porém dividiram o teu povo,
e irmão contra o irmão
mandaram, até que tombaram
as pedras da tua fortaleza.
Ataram os teus membros cansados
a quatro cavalos raivosos
e esquartejaram a luz
do amanhecer implacável.

Tupac Amaru, sol vencido,
de tua glória desgarrada
sobe como o sol do mar
uma luz desaparecida.
As fundas aldeias de argila,
os teares sacrificados,
as úmidas casas de areia
dizem em silêncio: "Tupac",
e Tupac é uma semente,
dizem em silêncio: "Tupac",
e Tupac se guarda no sulco,
dizem em silêncio: "Tupac",
e Tupac germina na terra.

*Do Livro Canto Geral

terça-feira, 5 de julho de 2011

RÉQUIEM GRANÍTICO

Caio Martins


The Dream - Inga Nielsen


















Menina vadia
brincando de pedra
cadê tua impudícia
teu jeito de cio?

A pedra é inútil
a pedra é amorfa
a pedra é tão fria
a pedra é estática
a pedra errática
tem oclusões vaginais
tem pedrinha hepática
por beber sonhos demais.

Quer ser celebridade
quer invadir a cidade
nua nos jornais...

A pedra quer ser escultura
a pedra quer ser pintura
a pedra quer ser partitura
quer ser imagem de santa
beijada no pé, num altar
quer ser a heroína
da hecatombe universal.

No meio da vida
nua se viu
no meio do peito
da cama do poeta...

... e armou o capeta.

Vai ver que de tanto
brincar que era pedra
no enleio do ato
chutou o amor
que virou, de repente,
pedrinha miúda
num pé de sapato...

(Vila Mirim, 01/12/1966 - Pensão da Zulmira, 14/06/1987.)