Este canto é para os que se encantam com a poesia, com a vida, com a natureza, com a alma humana, em suas mais diversas facetas.
quinta-feira, 20 de dezembro de 2012
quarta-feira, 5 de dezembro de 2012
A GRANDE MENTIRA
Lino Vitti
Não é mais o viver que seguir por atalho
desafiando a dor, em dores se estorcendo,
muitas vezes ao lado humanas feras vendo,
outras muitas, do amor, famélico espantalho.
Vai conosco um fantasma, esquálido e tremendo,
castigo do pecado – o peso do trabalho.
O homem labuta em vão, demais pesa-lhe o malho,
de mentira em mentira a gente vai morrendo.
Estúpida ilusão, nela se engolfa o homem,
fatídica e falaz foge a felicidade
enquanto a humanidade engrandece o abdomem.
Queimam-se sonhos mil ao longo do caminho,
vai-se a vida em fumaça e no altar da vaidade
a humanidade reza e endeusa o que é mesquinho.
Não é mais o viver que seguir por atalho
desafiando a dor, em dores se estorcendo,
muitas vezes ao lado humanas feras vendo,
outras muitas, do amor, famélico espantalho.
Vai conosco um fantasma, esquálido e tremendo,
castigo do pecado – o peso do trabalho.
O homem labuta em vão, demais pesa-lhe o malho,
de mentira em mentira a gente vai morrendo.
Estúpida ilusão, nela se engolfa o homem,
fatídica e falaz foge a felicidade
enquanto a humanidade engrandece o abdomem.
Queimam-se sonhos mil ao longo do caminho,
vai-se a vida em fumaça e no altar da vaidade
a humanidade reza e endeusa o que é mesquinho.
(Soneto publicado com a autorização do autor)
sexta-feira, 30 de novembro de 2012
DESAFIOS DA VIDA
Humberto Rodrigues Neto
Se usas frases difíceis, cerra os
lábios
e poupa à tua platéia o tom maçante:
se ali houver dez a comparar-te aos sábios,
cem haverá que te acharão pedante.
torná-lo um homem deve a educação,
e nunca fazer dele um especialista!
os cemitérios andam já repletos
de gente que era insubstituível!
(Poema enviado por email pelo autor)
(Humberto - Poeta)
e poupa à tua platéia o tom maçante:
se ali houver dez a comparar-te aos sábios,
cem haverá que te acharão pedante.
Não queiras ter num filho o campeão
da escola, em teu orgulho
exclusivista:torná-lo um homem deve a educação,
e nunca fazer dele um especialista!
Teus dons não julgues por demais
completos,
nem teu concurso em tudo
imprescindível:os cemitérios andam já repletos
de gente que era insubstituível!
(Poema enviado por email pelo autor)
domingo, 28 de outubro de 2012
ORFEU DILACERADO
Cicero Melo
Agora denomino e me diviso.
Minhas mãos e braços estão na janela,
Onde habitam as palavras verdes
E amarelas do vento ensandecido.
Minhas pernas estão na fronteira
Do prazer e da solidão.
Lá, as línguas não se desatam.
É o país das palavras vermelhas,
Onde a noite tece sua condescendência.
O tronco foi dilapidado no país dos amores inconclusos
Que devoram todas as cores.
A cabeça, ó deuses cegos e vazios,
Explodiu dentro de vós,
Vinha.
(Poema enviado pelo autor por email)
Agora denomino e me diviso.
Minhas mãos e braços estão na janela,
Onde habitam as palavras verdes
E amarelas do vento ensandecido.
Minhas pernas estão na fronteira
Do prazer e da solidão.
Lá, as línguas não se desatam.
É o país das palavras vermelhas,
Onde a noite tece sua condescendência.
O tronco foi dilapidado no país dos amores inconclusos
Que devoram todas as cores.
A cabeça, ó deuses cegos e vazios,
Explodiu dentro de vós,
Vinha.
(Poema enviado pelo autor por email)
segunda-feira, 24 de setembro de 2012
Luto
sábado, 18 de agosto de 2012
Márcia Sanchez Luz em "EisFluências"
Revista eisFluências publica Márcia Sanchez Luz, numa iniciativa de Marco Bastos, um dos colaboradores da mesma
A revista está registrada no ISSN e na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro-Brasil)
ISSN 2177-5761
Direção: Victor Jerónimo (Portugal/Brasil)
Direção Cultural: Carmo Vasconcelos (Portugal)Responsável pela Redação: Mercedes Pordeus (Brasil)
terça-feira, 14 de agosto de 2012
Bertold Brecht
Poema da rosa
Bertold Brecht
Tradução de Augusto Boal
Há uma rosa linda
No meio do meu jardim
Dessa rosa cuida eu
Quem cuidará de mim?
De manhã desabrochou
À tarde foi escolhida
Pra de noite ser levada
De presente a minha amiga
Feliz de quem possui
Uma rosa em seu jardim
A minha amiga com certeza
Pensa agora só em mim
Quando sopra o vento frio
E o inverno gela o jardim
Eu tenho calor em casa
E fico quietinho assim
Feliz de quem tem o seu teto
Pra ajudar a sua amiga
A fugir do vento ruim
Que deixa gelado o jardim
(Poema extraído de Blocos Online)
segunda-feira, 30 de julho de 2012
Celebrando o nascimento de Mario Quintana
(Mario Quintana - 30.07.1906 - 05.05.1994)
|
Os poemas abaixo são de Mario Quintana
AMOR
Quando duas pessoas fazem amor
Não estão apenas fazendo amor
Estão dando corda ao relógio do mundo.
Não estão apenas fazendo amor
Estão dando corda ao relógio do mundo.
Se tu me amas, ama-me baixinho
Não o grites de cima dos telhados
Deixa em paz os passarinhos
Deixa em paz a mim!
Se me queres,
enfim,
tem de ser bem devagarinho, Amada,
que a vida é breve, e o amor mais breve ainda...
Eu, agora - que desfecho!
Já nem penso mais em ti...
Mas será que nunca deixo
De lembrar que te esqueci?
Já nem penso mais em ti...
Mas será que nunca deixo
De lembrar que te esqueci?
O luar,
é a luz do Sol que está sonhando
O tempo não pára!
A saudade é que faz as coisas pararem no tempo...
...os verdadeiros versos não são para embalar,
mas para abalar...
A grande tristeza dos rios é não poderem levar a tua imagem...
Coração que bate-bate...
Antes deixes de bater!
Só num relógio é que as horas
Vão passando sem sofrer.
segunda-feira, 23 de julho de 2012
A poesia de Cecília Villanova
CANTO DE AMOR AO POEMA
Mas, não emudecerão
Meus pensamentosNem secará a tinta de sangue
Que goteja de minhas mãos.
O poema, em mim, inunda
Tal qual um rio
Feito de lágrimas,
Águas Claras ...
De onde emerge vida.
quarta-feira, 11 de julho de 2012
Poema de Théo Drummond
CUIDADO
THÉO DRUMMOND
SOU COMO A ÁRVORE SIM,
E O TEMPO PARECE O VENTO
QUE TEM O DESTINO RUIM
DE SEPARAR O QUE TENTO
CONSERVAR JUNTO DE MIM:
- AS FOLHAS QUE NUM MOMENTO
VÃO TER, NA QUEDA, O SEU FIM.
THÉO DRUMMOND
E O TEMPO PARECE O VENTO
QUE TEM O DESTINO RUIM
DE SEPARAR O QUE TENTO
CONSERVAR JUNTO DE MIM:
- AS FOLHAS QUE NUM MOMENTO
VÃO TER, NA QUEDA, O SEU FIM.
QUANDO CAIREM NO CHÃO
segunda-feira, 9 de julho de 2012
De Luiz de Miranda para Juareiz Correya
SONETO IMPROVISADO PARA JUAREIZ CORREYA
Luiz de Miranda
Dou graças de luz por ti e por Palmares,
e palmilho o sonho de quem vive
entre engenhos de amor e arte.
És onde vejo o canto do bemtevi,
os gorjeios de Ascenso e Hermilo
que levam no vento só aquilo
que no coração é pura paixão,
nós noturnos, imensos e lisos
que a brisa alteia do Recife,
e me torna forte no sul a alma
de um jeito que me alucina,
menina de rios e mar sagrado.
Juareiz, leva contigo o abraço
feito de amigo jogado no espaço.
(Porto Alegre, começo da tarde de domingo, 9 de novembro de 2008).
e palmilho o sonho de quem vive
entre engenhos de amor e arte.
És onde vejo o canto do bemtevi,
os gorjeios de Ascenso e Hermilo
que levam no vento só aquilo
que no coração é pura paixão,
nós noturnos, imensos e lisos
que a brisa alteia do Recife,
e me torna forte no sul a alma
de um jeito que me alucina,
menina de rios e mar sagrado.
Juareiz, leva contigo o abraço
feito de amigo jogado no espaço.
(Porto Alegre, começo da tarde de domingo, 9 de novembro de 2008).
terça-feira, 3 de julho de 2012
FEITO AVE
Edir Pina de Barros
|
Nos ermos entre a rosa e seus espinhos
existe um mundo denso, indecifrável,
cortado por veredas, mil caminhos,
etéreo como os sonhos. Impalpável!
Um mundo onde o tempo é interminável,
sem sentimentos sórdidos, mesquinhos...
sem dores. Sem penares. Inefável!
Aonde vamos todos, aos pouquinhos...
E assim a vida explode no universo,
transcende a vil matéria, voa aos céus
cortando seus espaços, feito nave.
Quando o poeta canta e chora em verso
esgarça desse mundo, seus mil véus
e voa nos seus céus, qual fosse ave.
(Soneto enviado pela autora)
domingo, 24 de junho de 2012
"Turbilhão no céu" recebe Prêmio Bem Te Vi
Prêmio Cultural Bem Te Vi agracia, este ano, três destaques do livro Melhores da Poesia Brasileira.
Anjo, de Ray Nonato
Vestimenta, de Clau Assi
Turbilhão no Céu, de Márcia Sanchez Luz
terça-feira, 19 de junho de 2012
Márcia Sanchez Luz em "Melhores da Poesia Brasileira"
Organização: Jane Rossi e Monica Rosenberg
Autores convidados:
Thiago De Menezes - Prefácio
Wilson de Oliveira Jasa - Apresentação
Adelaide Ortiz
Alzira Andrade
Amarilis Pazini Aires
Andrea Lucia
Ataíde Lemos
José Antônio Gama De Souza - Balzac
Bebe - Elisabeth Zamboneti Rylko
Brenda Mar(Que)S Pena
Celina Vasques
Clau Assi
Cláudio Bento
Clevane Pessoa de Araújo Lopes
Cler Ruwer
Conceição Bentes
Dimythryus
Deslanieve Daspet
Dorothy De Castro
Dyandreia Valverde Portugal
Luna Freire
Elcio José de Moraes
Elias Akhenaton
Edvaldo Marcelo Vieira da Silva
Edvaldo Rosa
Eugenio Santana
Scoffeald Mik
Emilia De Paula
Fabiano Fernandes Garcez
Fabio Ramos
Flor de Esperança
Helena Frontine
Hortência Lopes
Irsemis Wiezel Benedick
Izabel Marques
Jaak Bosmans
Janaina Rossi
Jane Rossi
Jenario De Fátima
Jiselda Oliveira
João Udine Vasconcelos
Joaquim Moncks
Jorge Luiz Vargas
José Bonifácio
Júlio Teixeira de Lima
Katia Pérola
Leila Ullmann
Luiz Carlos Costa Paula
Machado De Carlos
Márcia Sanchez Luz
Marçal Filho
Maia De Melo Lopo
Manuel Paulo
Maria Dolores Pimentel de Rezende
Maria Helena Sleutjes
Maria Moreira
Maria Zimbrunes Dutra
Marco Llobus
Marco Antonio Orsi
Marcus Rios
Marleninha Castilho
Marilia Abduani
Marisa De Medeiros
Marta Bittencout
Mírian Warttusch
Monica Rosenberg
Mora Alves
Neide Cardoso
Neneca Barbosa
Nice Ventura
Osvaldo Antônio Begiato
Osmar Vasconcelos
Homenino Poeta
Raimundo Nonato
Raquel Dias
Regina Pessoa
Regina Kreft
Rô Lopes
Rosângela de Souza Goldoni
Rossana Monteiro
Sá De Freitas
Selene de Lima Maria (Selene Antunes)
Simone Cristina
Sônia Maria Nunes
Télio Diniz
Teresa Improta Monnier
Terezinha Oliveira
Terezinha Werson
Valdeck Almeida De Jesus
Valquíria Cordeiro Goulart Gonçalves
Washington Ramos
Zeza Marqueti
Valquíria Cordeiro Goulart Gonçalves
Washington Ramos
Zeza Marqueti
domingo, 10 de junho de 2012
Travessias
"O
espetáculo foi criado a partir das técnicas da Dramaturgia do Desejo, desenvolvida pela
Cia. Silvana Abreu desde 2003. Essa metodologia implica em criação
colaborativa, baseada em treinamento corporal intensivo e estudos
interdisciplinares, desenvolvendo uma dramaturgia contemporânea que rompe o
limite entre ficção e realidade, em busca de um acontecimento teatral
atualizado, intenso, vivo e vibrante.
Com o
tema inicial proposto pela diretora – Travessias – os atores-performers
elaboraram imagens e narrativas simbólicas sobre suas experiências em situações
de atravessamento. Nascimento, amadurecimento, paixão, amor, vida e morte se
moldaram no corpo de cada um, a partir de suas vivências únicas pelos diversos
rituais de passagem da vida. Essas imagens foram reunidas em composições
dinâmicas até maturar numa dramaturgia mais ampla, provocando cada criador a
viver realmente uma Travessia durante o processo de criação do
espetáculo, além de ritualizar esse acontecimento durante a apresentação
pública.
Abordamos então, simbolicamente, as diversas
situações limites em que uma pessoa pode se deparar durante a vida e como ela
enfrenta, resiste, luta, supera, atravessa e chega a um novo patamar da própria
existência, ultrapassando fronteiras que pareciam intransponíveis. A coragem de
enfrentar e se lançar a essa travessia, se despojando dos velhos recursos e
padrões conhecidos e assumindo todos os riscos. Do outro lado, talvez o nada,
talvez a alegria absurda do encontro com a própria vida em intensidade
redobrada, compartilhada no rito teatral."
Mais informações no site: http://www.silvanaabreu.com/
sábado, 9 de junho de 2012
A Bruxa, de Drummond
Carlos Drummond de Andrade
(Img: Márcia Sanchez Luz)
Nesta cidade do Rio,
de dois milhões de habitantes,
estou sozinho no quarto,
estou sozinho na América.
Estarei mesmo sozinho?
Ainda há pouco um ruído
anunciou vida ao meu lado.
Certo não é vida humana,
mas é vida. E sinto a bruxa
presa na zona de luz.
De dois milhões de habitantes!
E nem precisava tanto...
Precisava de um amigo,
desses calados, distantes,
que lêem verso de Horácio
mas secretamente influem
na vida, no amor, na carne.
Estou só, não tenho amigo,
e a essa hora tardia
como procurar amigo?
E nem precisava tanto.
Precisava de mulher
que entrasse neste minuto,
recebesse este carinho,
salvasse do aniquilamento
um minuto e um carinho loucos
que tenho para oferecer.
Em dois milhões de habitantes,
quantas mulheres prováveis
interrogam-se no espelho
medindo o tempo perdido
até que venha a manhã
trazer leite, jornal e clama.
Porém a essa hora vazia
como descobrir mulher?
Esta cidade do Rio!
Tenho tanta palavra meiga,
conheço vozes de bichos,
sei os beijos mais violentos,
viajei, briguei, aprendi.
Estou cercado de olhos,
de mãos, afetos, procuras.
Mas se tento comunicar-me
o que há é apenas a noite
e uma espantosa solidão.
Companheiros, escutai-me!
Essa presença agitada
querendo romper a noite
não é simplesmente a bruxa.
É antes a confidência
exalando-se de um homem.
Fonte: Portal São Francisco
(Img: Márcia Sanchez Luz)
Nesta cidade do Rio,
de dois milhões de habitantes,
estou sozinho no quarto,
estou sozinho na América.
Estarei mesmo sozinho?
Ainda há pouco um ruído
anunciou vida ao meu lado.
Certo não é vida humana,
mas é vida. E sinto a bruxa
presa na zona de luz.
De dois milhões de habitantes!
E nem precisava tanto...
Precisava de um amigo,
desses calados, distantes,
que lêem verso de Horácio
mas secretamente influem
na vida, no amor, na carne.
Estou só, não tenho amigo,
e a essa hora tardia
como procurar amigo?
E nem precisava tanto.
Precisava de mulher
que entrasse neste minuto,
recebesse este carinho,
salvasse do aniquilamento
um minuto e um carinho loucos
que tenho para oferecer.
Em dois milhões de habitantes,
quantas mulheres prováveis
interrogam-se no espelho
medindo o tempo perdido
até que venha a manhã
trazer leite, jornal e clama.
Porém a essa hora vazia
como descobrir mulher?
Esta cidade do Rio!
Tenho tanta palavra meiga,
conheço vozes de bichos,
sei os beijos mais violentos,
viajei, briguei, aprendi.
Estou cercado de olhos,
de mãos, afetos, procuras.
Mas se tento comunicar-me
o que há é apenas a noite
e uma espantosa solidão.
Companheiros, escutai-me!
Essa presença agitada
querendo romper a noite
não é simplesmente a bruxa.
É antes a confidência
exalando-se de um homem.
Fonte: Portal São Francisco
segunda-feira, 4 de junho de 2012
domingo, 27 de maio de 2012
Fui um réptil?
Leila Míccolis
(crônica
publicada no YuBliss)
Em
criança, nunca me dei bem com brincadeiras do faz-de-conta. Achava um reino um
tanto desconfortável, onde a realidade, em confronto com a imaginação,
revelava-se frustrante e insuficiente. Para mim, era muito difícil imaginar,
nas panelinhas, comidinhas inexistentes, ou então ensinar bonecas mudas, que me
olhavam alheias e indiferentes e nunca aprendiam absolutamente nada. Entendo
agora que para mim, na época, o faz-de-conta assemelhava-se a certas
propagandas enganosas que assistimos hoje na publicidade.
O nunca
encenar “teatrinhos” na infância possivelmente marcou muito a minha postura
diante da vida, fazendo-me distinguir no dia a dia fantasia da realidade, não
para dicotomizar-me, mas para aprender a trabalhar com os diversos ângulos de
mim, simultaneamente: eu e meus múltiplos. Nem sempre é fácil na vida real
saber onde acaba o “se” e onde começa o “agora”, talvez porque a realidade, com
suas diversas interpretações, pode ser tão fluida quanto a fantasia. No
entanto, ciente dos meus mundos paralelos, acabei evitando cair na armadilha de
protagonizar papéis na vida real, me tornando uma personagem de mim mesma.
O fato
inconteste é que sempre preferi o diálogo com os livros. Eles me mostravam, por
exemplo, o habitat dos peixes, cheio de cores, formas e magia. Como eu adorava
o colorido mundo submarino com seus animais e sua flora exótica. Antes mesmo de
saber ler, eu me deliciava com as ilustrações, imaginando histórias das
profundezas abissais. Isto era bem diferente do mero faz-de-conta. O oceano
existia, os peixes também, e eu apenas inventava aventuras. Os livros me
revelavam o mundo real, enquanto o faz-de-conta me soava como um palco, em que
só se encenava monólogos. A ficção, portanto, era uma forma de eu própria
transitar pelos universos e não de moldá-los à minha imagem e semelhança. Esta
diferença de perspectiva fazia muita diferença. Sempre fez. Nas fotos coloridas
havia diversos espécimes de animais, inclusive a tartaruga marinha. Pronto:
cheguei onde eu queria.
Falando
no facebook sobre meu micro, lento que nem tartaruga, revelei ao Chico Abelha que
minha relação com elas era muito pouco amistosa, digamos até conflituosa. Então
ele perguntou: “como analisaríamos uma mulher que adora gatos e cachorros, mas
tem horror crônico a tartarugas...? rsrsrssrs! freud explicaria?” Devidamente
instigada, fiquei de escrever sobre o assunto: a rara exceção do meu amor aos
animais. Não se trata porém de desamor, é bem mais complexo: algo me incomoda
profundamente nelas e, ao nos depararmos frente a frente, face a face, olho a
olho, ocorre de imediato o processo atração x rejeição: elas correm (maneira de
dizer) em minha direção e eu corro em direção contrária a delas. Não me importo
com o tamanho: mesmo que você me apresente a mais meiga, suave e menor
tartaruga do mundo na palma de sua mão, provavelmente me sentirei ameaçada.
Lembro-me de que, uma vez, visitei alguém que tinha um cão feroz e uma
tartaruga no quintal, e quando a dona da casa me disse: – “um momento que vou
prender o cachorro”, eu pedi: – “não, por favor, prenda apenas a tartaruga”...
A gargalhada foi geral, porque se tratava de uma tartaruga minúscula,
“inofensiva” segundo sua dona; mas só me senti segura com a tartaruga presa no
banheiro – nem preciso dizer que minha visita demorou o mínimo possível para
não estressar a tartaruguinha.
Volto
ao início: mentira, invenção, teatralização, fantasia, mesmo sendo bem difícil
às vezes de perceber a diferença, elas ficam muito claras se as transponho para
minha ligação (des)afetiva com as tartarugas. Vou dar exemplos: mentira é dizer
que amo tartarugas. Invenção seria alardear que salvei alguma de morrer
devorada por um tubarão; que tirei alguma foto sorrindo acariciando o casco de
alguma delas, é pura teatralização (inclusive, se virem alguma fotografia
assim, saibam que provavelmente ela foi editada...); e, por fim, trata-se de
fantasia quando pratico nado de peito (o tipo de estilo que eu mais gosto) e me
sinto como se fosse uma tartaruga marinha, o que ocorre frequentemente. E aí
realmente entra Freud, meu caro Chico: até meu próprio signo capricórnio (a
cabra marinha) indica que devo ter vindo do mar (meu sonho recorrente é sempre
com ele) antes de pisar na terra. Não que eu queira fazer aqui nenhum tipo de
regressão, mas pode ser até que em alguma encarnação passada, através da
metempsicose transmigratória, eu tenha sido uma tartaruga que acabou virando
sopa... (não entro em hipótese alguma em restaurantes que pescam lagostas ou
peixes vivos, tipo: pesque e pague); daí se explicaria o total incômodo que
sinto ao ver uma tartaruga – revivo a dor ancestral da profanação: ser caçada,
morta, esquartejada e comida publica e impudicamente à mesa? – e também minha
enorme resistência em sentir prazer de degustar quaisquer tipos de “frutos do
mar”...
(Publicado com a autorização da autora)
quinta-feira, 24 de maio de 2012
Carta para quando eu for velha
Kika Coutinho
Um
dia, e não deve demorar muito, vou notar fios brancos no meu cabelo. Pior: um
dia, vou procurar se restaram alguns fios pretos no meu cabelo. Vou sentir
algumas dores nas pernas, ou nas costas, ou a carga da vida será pesada para
mim.
E,
se eu pudesse deixar um recado para essa mulher que eu serei então, eu pediria,
talvez, para que ela fosse doce. Quando eu for velha, desejo manter alguma
alegria, ainda que amargura me seja tentadora, que eu possa ver alguma beleza
na vida.
Que
eu possa ver beleza em mim mesma, mesmo que meu rosto esteja amassado, os olhos
um pouco apagados, que eu me lembre de quanto achava ridículo as mulheres
lotadas de botox,e não caie na armadilha de esticar-me toda, para tentar ser
aquilo que não preciso mais ser. Que eu me lembre desse tempo de hoje, e aceite
essa outra forma de beleza, senão sem dores, com muita dignidade.
Que
eu tenha mãos firmes para passar base e, quiçá delineador, que eu saiba o valor
e o momento de um bom perfume, de um bom penteado, de uma roupa bem cortada.
Que eu não caia na tentação de vestir-me como uma velha, ou – pior – que eu não
caia no ridículo de usar roupas parecidas com as das minhas netas.
Que
eu não implique com a vida, com o tempo, com o meu companheiro. Aliás, se ele
tornar-se irritante, diabético, surdo ou o que quer que seja, desejo lembrar-me
das promessas antigas, do companheirismo de uma vida, das inúmeras vezes em que
eu, jovem, fui irritante e surda, e ele esteve ao meu lado. Que eu possa
relevar as frases repetidas, que eu tenha paciência para as pequenezas dele, e
procure evitar as minhas. Que eu saiba rir da vida, de mim mesma, de nós dois.
Mesmo que as piadas sejam péssimas; as gargalhadas não deveriam tornar-se tão
raras quanto as caminhadas ou as corridas. Que eu possa ainda, fazer meu
companheiro rir, mesmo que me dê uma preguiça danada.
Que
eu não cobre dos meus filhos, netos, amigos, mais do que eles me ofereçam. E
que, em sendo oferecido pouco deles a mim, que isso não me amargure, mesmo que
seja infinitamente injusto e cruel – e deve ser – que eu tenha aceitação e
alegria. Que eu tenha assunto e conhecimento, que eu tenha prazeres e
encantamentos, sabedoria e discernimento.
Que
eu me mantenha lendo bastante, para que eu possa achar assunto nos jornais, nas
revistas, nos novos e nos velhos livros. Senão me restar amigos, ou amores, que
o conhecimento me salve de uma rotina infinitamente chata e comprida.
Que
eu aprenda a apreciar flores, comida, música, ou qualquer uma dessas coisas
oferecidas em abundância pela vida, porque, assim, mesmo que me falte o resto,
ainda terei o gosto ou o som do que me faz feliz.
E,
enfim, se eu pudesse deixar um último recado a essa velhinha que eu serei, eu
pediria que ela lembrasse da menina que foi um dia e que fosse gentil com essa
moça, com seus próprios erros, acertos, escorregadas e tentativas vãs.
Que ela não fosse muito rígida com a vida, e nem com essa jovem abusada e tola
que, um dia, sentou-se num jardim ensolarado, para deixar-lhe uma pequena
carta, cheia de palavras e idéias que, talvez, um dia, não façam,
absolutamente, o menor sentido.
(Do livro "ACABA NÃO, MUNDO")
segunda-feira, 21 de maio de 2012
DILEMA
Marco Bastos
Eu trago nesse canto em pauta, por dilema
sofrido pensamento à beira dum riacho
com tocha que se acende em rochas sem poema
perdido em meu conflito aflito onde me acho.
Se encontro em desencontro a trama do problema
começo e já reparto a questão de alto a baixo
divido bem o todo em partes-teorema
e são coisas que igualo a causas que não encaixo.
Sinto a dualidade e a vida se bifurca
em cada encruzilhada à frente do caminho
- no canto do meu fado a vida quer mazurca.
À margem do riacho ao olhar redemoinho,
a voragem que cega à noite me conspurca
querendo alinhar água e água é desalinho.
Riacho na sombra - Courbet
|
Eu trago nesse canto em pauta, por dilema
sofrido pensamento à beira dum riacho
com tocha que se acende em rochas sem poema
perdido em meu conflito aflito onde me acho.
Se encontro em desencontro a trama do problema
começo e já reparto a questão de alto a baixo
divido bem o todo em partes-teorema
e são coisas que igualo a causas que não encaixo.
Sinto a dualidade e a vida se bifurca
em cada encruzilhada à frente do caminho
- no canto do meu fado a vida quer mazurca.
À margem do riacho ao olhar redemoinho,
a voragem que cega à noite me conspurca
querendo alinhar água e água é desalinho.
sexta-feira, 18 de maio de 2012
Imprecisões
Luiz Eduardo Caminha
quarta-feira, 16 de maio de 2012
Encruzilhada
Antonio Manoel Abreu Sardenberg
Na encruzilhada da vida,
A dúvida bate tão forte
Que a gente perde o norte,
A reta, a rota, o rumo...
Perde o equilíbrio, o prumo,
O tino, o jeito, o porte.
Perde o fio da meada
E, para achar a estrada,
É preciso muita sorte.
A razão com seu jeitinho
Fala pra gente baixinho
Qual o caminho mais certo,
Qual o atalho mais perto,
Onde fica o paraíso!
Aí vem o coração
Cheio de sonho e paixão
A discordar do juízo...
A incerteza aparece.
Nosso peito então padece,
Sem saber a quem ouvir.
E pra gente se encontrar,
Aonde devemos ir?
Vamos partir para o norte,
O leste, o centro, o oeste
Ou esperar que, na noite,
Naquele céu todo azul
Brote o cruzeiro do sul
Nos apontando ao certo
O nosso porto seguro
E nos tirar do apuro,
Nos resgatar do deserto
E com a lição aprender
Que, em toda encruzilhada,
Há uma direção errada,
E outra que é a certa,
Que nos conduz a chegada!
(Poema publicado com a autorização do autor)
Os mistérios do horizonte - René Magritte
|
Na encruzilhada da vida,
A dúvida bate tão forte
Que a gente perde o norte,
A reta, a rota, o rumo...
Perde o equilíbrio, o prumo,
O tino, o jeito, o porte.
Perde o fio da meada
E, para achar a estrada,
É preciso muita sorte.
A razão com seu jeitinho
Fala pra gente baixinho
Qual o caminho mais certo,
Qual o atalho mais perto,
Onde fica o paraíso!
Aí vem o coração
Cheio de sonho e paixão
A discordar do juízo...
A incerteza aparece.
Nosso peito então padece,
Sem saber a quem ouvir.
E pra gente se encontrar,
Aonde devemos ir?
Vamos partir para o norte,
O leste, o centro, o oeste
Ou esperar que, na noite,
Naquele céu todo azul
Brote o cruzeiro do sul
Nos apontando ao certo
O nosso porto seguro
E nos tirar do apuro,
Nos resgatar do deserto
E com a lição aprender
Que, em toda encruzilhada,
Há uma direção errada,
E outra que é a certa,
Que nos conduz a chegada!
(Poema publicado com a autorização do autor)
sábado, 12 de maio de 2012
A poesia de Rubens Jardim
COMO UM PRESENTE
Rubens Jardim
O que eu vou guardar da tua infância
Não é a superfície mansa e lisa da tua pele.
Também não é o olhar livre da menina
Que te habita desde a origem da vida.
O que eu vou guardar da tua infância
É uma coisa indizível e impartilhável.
Talvez seja a primeira expressão lírica
Que impressionou tua alma. O grito
Sem som. O espelho sem imagem.
A palavra sem papel.
O que eu vou guardar da tua infância
não é o eternizado chão de terra
Onde se achava inscrito o teu futuro.
Também não é a casa da meninice
Anoitecendo à luz de velas e lamparinas.
O que eu vou guardar da tua infância
É uma coisa indizível e impartilhável.
Talvez seja a fragilidade do teu rosto
Onde o destino jamais poderia dar
Uma bofetada. Ou ainda o abismo
Sem a queda. A escada sem degrau.
A porta sem a parede.
O que eu vou guardar da tua infância
Não é a paisagem real e transitiva
Suspensa em plataforma de súplica.
Também não é a provisória criança
Maravilhada diante das lições da eternidade.
O que eu vou guardar da tua infância
É uma coisa indizível e impartilhável.
Talvez seja a tua graça caminhando
Pela mesma trilha dos ventos nas montanhas.
Ou ainda as estrelas sem a noite.
As crianças sem o medo. Os cachorros sem quintais.
O que eu vou guardar da tua infância
É o substrato que te acompanha
Nessa viagem rumo ao desconhecido.
É o teu modo pleno de estar aqui
Revelando sinais do inaparente e do inexpresso.
Não é a superfície mansa e lisa da tua pele.
Também não é o olhar livre da menina
Que te habita desde a origem da vida.
O que eu vou guardar da tua infância
É uma coisa indizível e impartilhável.
Talvez seja a primeira expressão lírica
Que impressionou tua alma. O grito
Sem som. O espelho sem imagem.
A palavra sem papel.
O que eu vou guardar da tua infância
não é o eternizado chão de terra
Onde se achava inscrito o teu futuro.
Também não é a casa da meninice
Anoitecendo à luz de velas e lamparinas.
O que eu vou guardar da tua infância
É uma coisa indizível e impartilhável.
Talvez seja a fragilidade do teu rosto
Onde o destino jamais poderia dar
Uma bofetada. Ou ainda o abismo
Sem a queda. A escada sem degrau.
A porta sem a parede.
O que eu vou guardar da tua infância
Não é a paisagem real e transitiva
Suspensa em plataforma de súplica.
Também não é a provisória criança
Maravilhada diante das lições da eternidade.
O que eu vou guardar da tua infância
É uma coisa indizível e impartilhável.
Talvez seja a tua graça caminhando
Pela mesma trilha dos ventos nas montanhas.
Ou ainda as estrelas sem a noite.
As crianças sem o medo. Os cachorros sem quintais.
O que eu vou guardar da tua infância
É o substrato que te acompanha
Nessa viagem rumo ao desconhecido.
É o teu modo pleno de estar aqui
Revelando sinais do inaparente e do inexpresso.
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